JUDICIAL DECISIONS IN THE FACE OF A PANDEMIC SCENARIO
30 de March de 2020
SUSPENSION OF THE EMPLOYMENT CONTRACT - PANDEMIC
16 de April de 2020

GENERAL INFORMATION ABOUT THE EFFECTS OF COVID-19 ON LABOR RELATIONS

Diante da emergência sanitária em decorrência da pandemia do Covid-19 (Coronavírus), assim como considerando as diretrizes e recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e das autoridades federais e estaduais brasileiras quanto às medidas temporárias de prevenção ao contágio, surge a necessidade de edição de medidas extraordinárias que suscitam inúmeros questionamentos, especialmente nas relações de trabalho e entre empregados e empregadores.

Inicialmente, é importante ressaltar que a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) não traz determinações específicas capazes de prever o atual cenário criado pela incidência de um vírus potencialmente contagioso. O que poderá ocorrer é a aplicação analógica de certos dispositivos legais às situações e relações decorrentes e afetadas pelo Covid-19.

Contudo, para atender a esta demanda decorrente do estado de emergência internacional e pandemia decretados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), está em vigor legislação nacional que estabelece medidas para enfrentamento desta emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Covid-19. Trata-se da Lei Federal n0 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

Mencionada Lei Federal traz dois conceitos cuja a fixação é relevante, quais sejam, o de isolamento e o de quarentena. Assim estabelece seu art. art. 2º:

 

Art. 2º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:

  • isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus; e 
  • quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus. 

A Portaria do Ministério da Saúde n0 356, emitida em 11 de março de 2020, prevê que o isolamento tenha duração de 14 (quatorze) dias, passíveis de prorrogação por igual período, se exames comprovarem risco de transmissão (Art. 3º, § 1º). Já a quarentena terá prazo de até 40 (quarenta) dias, podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território nacional (Art. 4º, § 2º).

Ademais, no dia 22 de março de 2020, foi publicada a Medida Provisória n0 927 (MP n0 927), de iniciativa da Presidência da República, que dispõe  sobre as medidas trabalhistas que poderão ser adotadas para o enfrentamento do estado de calamidade pública e enquanto perdurar esta situação.

Assim, com o amparo constitucional e com base nas normatizações  acima citadas em vigência até o presente momento, passamos a esclarecer algumas dúvidas pertinentes à temática das relações de trabalho:

 

1)       Pessoas em isolamento/quarentena terão os dias não trabalhados descontados?

Não, desde que comprovem esta situação por meio de atestado médico ou de autoridade de saúde.

O parágrafo 3º do artigo 3º da Lei n0 13.979/2020 estabelece que será considerada falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada o período de ausência decorrente das medidas previstas neste artigo.

Frisa-se que a legislação trabalhista assegura ao trabalhador o pagamento de licença remunerada nos primeiros 15 (quinze) dias de afastamento, mediante atestado médico. Após este período, o trabalhador conta com a concessão de auxílio doença, após o seu encaminhamento à Previdência Social (INSS).

Importante salientar que o profissional autônomo que contribui regularmente ao INSS também terá direito ao auxílio doença, que se dará mediante perícia do Instituto.

 

2)   O trabalho remoto ou home office deve ser, obrigatoriamente, adotado? 

Apesar de muitas empresas estarem aderindo ao trabalho remoto ou home office, tal prerrogativa é uma liberalidade do empregador/empresa, não havendo na legislação nacional nenhuma exigência neste sentido.

O artigo 4º da MP n0 927, estabelece que o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para regimes de trabalho não presenciais, independentemente de acordos individuais ou coletivos, bem como, sem necessidade de fazer constar no contrato de trabalho. Ainda, em seu parágrafo primeiro, o artigo fixa o conceito de teletrabalho como a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo.

Imperioso mencionar que o empregador deverá fazer o comunicado desta alteração ao empregado com antecedência de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas, por meio eletrônico ou escrito (art. 4º, § 2º).

Por sua vez, com relação aos custos envolvidos na infraestrutura para a realização do trabalho remoto, continuam em vigor as disposições previstas no artigo 75-D da CLT, para o qual estes devem ser previstos em contrato individual escrito, mas podem ser firmadas no prazo de 30 (trinta) dias do início da reversão.

No mais, o empregador poderá colocar à disposição, em regime de comodato, os equipamentos necessários à realização das atividades pelos empregados, sendo expressamente indicada a natureza indenizatória desta parcela (não integrará o salário).

 

Por fim, ressalta-se que caso não haja a possibilidade de trabalho remoto por meio da utilização de equipamentos eletrônicos, ainda que emprestados do empregador, será preciso contabilizar a jornada de trabalho por algum meio, sendo considerado tempo à disposição do empregador (art. 4º, § 4º, inciso II da MP).

Estas regras trazidas por esta Medida Provisória se aplicam também aos estagiários e aprendizes, atentando-se que se houver a adoção do trabalho remoto pelo empregador, os direitos como vale transporte e vale alimentação devem ser mantidos, caso previstos em acordo coletivo ou convenção coletiva.

Não obstante, aos empregadores que não optarem pelo serviço à distância/teletrabalho/home office, a CLT determina que o ambiente de trabalho seja salubre e, apesar de não haver ordens específicas de salubridade no caso em particular, orienta-se que sejam adotadas as medidas estabelecidas Organização Mundial de Saúde (OMS).

 

Considerações: O privilégio de acordos individuais sobre convenções e acordos coletivos de trabalho tem sido alvo de reiteradas críticas, vez que viola a Convenção nº 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e favorece escolhas de caráter unilateral do empregador.

A previsão de não obrigatoriedade de aditivo na carteira de trabalho contraria a regra de que ela deve ser feita em até 30 (trinta) dias no regime de teletrabalho.

 

3)   Existe a possibilidade de antecipação de férias?

Uma alternativa que poderá ser avaliada e considerada pelas empresas e/ou empregadores largamente afetadas pelo contágio de seus cooperadores ou pelo abalo na sua cadeia produtiva, é a antecipação das férias, que passa a ser permitida na modalidade individual e coletiva pela MP n0 927/2020 em razão da decretação de estado de calamidade pública.

Para tanto, referida MP dispõe que as férias individuais não deverão ser inferiores a cinco dias corridos e podem ser concedidas mesmo nos casos em que o período aquisitivo de 12 (doze) meses ainda não tenha sido completado pelo empregado (Art.60).

Os trabalhadores enquadrados no grupo de risco do Covid-19 serão priorizados para o gozo de férias individuais ou coletivas (Art. 6º, § 3º).

Quanto à remuneração das férias concedidas durante o estado de calamidade pública, o pagamento poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias (Art. 90), e o adicional de um terço poderá ser realizado após a sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina prevista no art. 1º da Lei nº 4.749/65 (Art. 80).

Já para a concessão de férias coletivas, dispõe referida Medida Provisória que a formalidade legal de prévia comunicação ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria está dispensada, não sendo necessária. Entretanto, o empregador, caso opte pela concessão de férias coletivas, deverá notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas (Art. 11).

Por fim, com relação aos profissionais da saúde e aos que desempenham atividades essenciais, estes poderão ter suas férias ou licenças não remuneradas suspensas enquanto perdurar o estado de calamidade pública (Art. 70).

 

Considerações: Entende-se, atualmente, que a antecipação de férias individuais para o empregado que não tenha férias vencidas (ou seja, quando já completado o período aquisitivo) se enquadraria, na verdade, como licença remunerada. Nesse caso, se a licença durar mais de 30 (trinta) dias, inicia-se a contagem de novo período aquisitivo e perdem-se as férias proporcionais.

A suspensão de férias prevista para os trabalhadores da saúde e prestadores de serviços essenciais é temerária, vez que pode se prolongar no tempo indistintamente, razão pela qual essa previsão pode vir a ser anulada.

 

4)   Posso ter o meu contrato de trabalho suspenso?

De acordo com as determinações estabelecidas originariamente no art. 18 da MP n0 927/2020, o contrato de trabalho poderia ser suspenso por até quatro meses para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional à distância oferecido pelo empregador, diretamente ou por meio de entidades responsáveis pela qualificação, de duração equivalente ao período da suspensão.

No entanto, essa previsão foi revogada menos de 24 (vinte e quatro) horas após a promulgação da MP, diante da manifestação de diversos órgãos, associações e autoridades do país. A medida era claramente inconstitucional ao estabelecer a irredutibilidade salarial e a garantia do salário-mínimo, previstos como direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988.

Portanto, o que prevalece neste momento é a determinação de que o contrato de trabalho não poderá ser  suspenso, aguardando-se novas disposições sobre este tema em nova Medida Provisória.

 

5)  O pagamento do FGTS pode ser adiado?

O artigo 3º, inciso VIII da MP n0 927/2020, estabelece que o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) poderá ser adiado com o intuito de preservação do emprego e da renda.

O adiamento se refere aos meses de abril, maio e junho, sem a incidência de atualização, multa e encargos. Poderão ser parcelados em até 6 (seis) parcelas mensais a partir de julho de 2020 e deverão ser declarados até esta data, sob pena de os valores serem considerados em atraso e constituir obrigação do pagamento integral da multa e dos encargos devidos.

 

6)   Como ficam feriados e banco de horas? 

O artigo 13 da MP nº 927/2020 prevê que, durante o estado de calamidade pública, os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais. Estes feriados, assim, poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas. Isso significa que será possível determinar, por ato unilateral do empregador, a compensação de dias feriados não religiosos.

Para tanto, prevê-se que haja a notificação prévia para os empregados beneficiados, por escrito ou por meio eletrônico, com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas, indicando-se, expressamente, os feriados que serão aproveitados.

Atentamos para um ponto muito importante desta Medida Provisória para este tema: com relação aos feriados religiosos, para que seja feito o seu aproveitamento pelo empregador, deverá haver a concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.

No artigo 14, a MP n0 927/2020 autoriza o empregador a interromper as atividades e constituir regime especial de compensação da jornada de trabalho em até 18 (dezoito) meses após o fim do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas, que será estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual escrito. Desse modo, as horas não trabalhadas durante o  período  de interrupção das atividades poderão ser compensadas posteriormente, acrescentando-se 2 (duas) horas extras, até o limite de 10 (dez) horas diárias (Art. 14, § 1º).

 

Breves Considerações

Referidas medidas excepcionais que poderão ser adotadas nas relações de trabalho, e que flexibilizam determinadas normas da Consolidação das Leis Trabalhistas, enquanto perdurar o estado de calamidade pública, trazidas pela MP nº 927/2020, ainda que vigentes desde sua publicação (22/03/2020), deverão ser aprovadas pelo Congresso Nacional, que também poderá modifica-las. Logo, estas medidas devem ser acompanhadas ao longo de sua adoção pelos empregadores.

Atentamos, também, que esta Medida Provisória trouxe em suas disposições a adoção de efeito retroativo, ou seja, os atos adotados em consonância com as normas previstas no seu texto, nos 30 (trinta) dias anteriores à sua publicação, estão convalidados. Isso significa que estes atos são considerados legais, ainda que adotados 30 dias antes da publicação desta MP.

Diante deste cenário inédito e excepcional que o país e o mundo estão vivenciando, em que as mudanças ocorrem de forma instantânea, é importante estar atento à lesão de direitos e, no caso de dúvidas, consultar imediatamente um especialista a fim de se evitar ao máximo risco jurídicos futuros.

Além do respaldo jurídico adequado, todas as ações devem ser pautadas pelo uso do bom senso, tanto na condição de empregador quanto na de empregado, primando-se pelo zelo da saúde e bem-estar social de todos, sobretudo visando à proteção daqueles que estão em estado de vulnerabilidade diante desta epidemia global.

Amanda Miranda
Attorney
Wydra Advogados Associados

 

 

Fontes:

ANAMATRA.   Anamatra   se   manifesta   sobre   o    teor   da    MP 927/2020M.
Disponíve em:

<https://www.anamatra.org.br/imprensa/noticias/29459-anamatra-se-manifesta-sobre-o-teor-da-mp-927- 202>.

 

Brasil,    Medida    Provisória    nº    297,    de    22     de    março    de    2020.     Disponível    em:

<http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-927-de-22-de-marco-de-2020-249098775>.

 

Brasil,      Lei      nº      13.979,      de      6      de      fevereiro      de      2020.      Disponível      em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L13979.htm>.

 

Brasil, Portaria nº 356, de 11 de março de 2020. Disponível em: <http://www.in.gov.br/en/web/dou/-

/portaria-n-356-de-11-de-marco-de-2020-247538346>.

 

Tribunal Superior do Trabalho. Especial Coronavírus: como ficam as relações de trabalho? Disponível em:

<http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/25142571>.

 

 

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